28 setembro 2022

As taxas (casos e mortes) tornaram a cair e o pesadelo, enfim, parece estar com os dias contados

Felipe A. P. L. Costa [*]

RESUMO. – Este artigo atualiza as estatísticas mundiais a respeito da pandemia divulgadas em artigo anterior (aqui). No caso específico do Brasil, o artigo também atualiza os valores das taxas de crescimento. Entre 19 e 25/9, as taxas ficaram em 0,0186% (casos) e 0,0089% (mortes). Ambas tornaram a cair, após o susto da semana anterior. Mas a pandemia ainda não acabou. Máscaras e vacinas seguem na ordem do dia.

*

1. ESTATÍSTICAS MUNDIAIS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.

Levando em conta as estatísticas obtidas no fim da manhã de hoje (26/9) [1], eis um resumo da situação mundial.

(A) – Em números absolutos, os 20 países mais afetados [2] estão a concentrar 74% dos casos (de um total de 615.178.854) e 70% das mortes (de um total de 6.537.201) [3].

(B) – Nesses 20 países, 432 milhões de indivíduos receberam alta, o que corresponde a 95% dos casos. Em escala global, 601 milhões de indivíduos já receberam alta.

(C) – Olhando apenas para as estatísticas das últimas quatro semanas, eis um resumo da situação: (i) em números absolutos, a lista segue a ser liderada pelo Japão, com 2,53 milhões de novos casos; (ii) entre os cinco primeiros da lista, estão ainda os Estados Unidos (1,85 milhões), a Coreia do Sul (1,61), a Rússia (1,37) e Taiwan (1,03). O Brasil (256 mil) está na 10ª colocação; e (iii) a lista dos países com mais mortes segue a ser liderada pelos Estados Unidos (12,23 mil); em seguida aparecem Japão (5,35 mil), Rússia (2,63), Alemanha (2,354) e Brasil (2,353).

2. ESTATÍSTICAS BRASILEIRAS: SEMANA 19-25/9.

Ontem (25/9), de acordo com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde, foram registrados em todo o país mais 1.226 casos e 23 mortes [4]. Teríamos chegado assim a um total de 34.632.220 casos e 685.805 mortes.

Na semana encerrada ontem (19-25/9), foram registrados 45.173 casos e 429 mortes. Os dois totais caíram em relação aos números da semana anterior (12-18/9: 58.422 casos e 516 mortes).

3. O RITMO DA PANDEMIA EM TERRAS BRASILEIRAS.

Para monitorar de perto o ritmo e o rumo da pandemia, sigo a usar como guias as taxas de crescimento no número de casos e de mortes. Após uma breve estagnação, ambas tornaram a cair em relação aos valores da semana anterior.

Vejamos os resultados mais recentes.

A taxa de crescimento no número de casos caiu de 0,0242% (12-18/9) para 0,0186% (19-25/9) (ver a figura que acompanha este artigo) [5].

A taxa de crescimento no número de mortes caiu de 0,0107% (12-18/9) para 0,0089% (19-25/9). Este último é o valor mais baixo desde o início da série, em março de 2020.

*


FIGURA. O comportamento das médias semanais das taxas de crescimento no número de casos (pontos em azul escuro) e no número de óbitos (pontos em vermelho escuro) em todo o país (valores expressos em porcentagem), entre 12/9/2021 e 25/9/2022. (Para resultados anteriores, ver aqui.) Note que alguns pares de pontos são coincidentes ou quase isso.

*

4. CODA.

Após o susto da semana anterior (aqui), as taxas de casos e mortes tornaram a cair na semana passada. É uma boa notícia. E a notícia fica ainda melhor quando descobrimos que as estatísticas estão a arrefecer na maioria dos países, com raras exceções (e.g., Rússia, Taiwan, Turquia e Ucrânia).

O pesadelo parece estar com os dias contados. Mas ainda não acabou. Máscaras e vacinas devem continuar na ordem do dia, sobretudo no interior de lugares fechados. (Lembrando que a vacina combate a doença, mas não impede o contágio. O que pode impedir o contágio, notadamente no interior de recintos fechados, é o uso correto de máscara facial.)

*

NOTAS.

[*] Há uma campanha de comercialização envolvendo os livros do autor – ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para mais informações ou para adquirir (por via postal) os quatro volumes (ou algum volume específico), faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos e livros, ver aqui.

[1] Como comentei em ocasiões anteriores, as estatísticas de casos e de mortes estão a seguir o painel Mapping 2019-nCov (Johns Hopkins University, EUA), enquanto as de altas estão a seguir o painel Worldometer: Coronavirus (Dadax, EUA).

[2] Os 20 primeiros países da lista podem ser arranjados em 9 grupos: (a) Entre 95 e 100 milhões de casos – Estados Unidos; (b) Entre 40 e 45 milhões – Índia; (c) Entre 30 e 35 milhões – França, Brasil e Alemanha; (d) Entre 20 e 25 milhões – Coreia do Sul, Reino Unido, Itália, Japão e Rússia; (e) Entre 15 e 20 milhões – Turquia; (f) Entre 12 e 15 milhões – Espanha; (g) Entre 10 e 12 milhões – Vietnã e Austrália; (h) Entre 8 e 10 milhões – Argentina e Países Baixos; e (i) Entre 6 e 8 milhões – Irã, México, Indonésia e Colômbia.

[3] Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, tanto em escala mundial como nacional, ver os volumes da coletânea A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado, vols. 1-5 (aqui, aqui, aqui, aqui e aqui). Sobre o cálculo das taxas de crescimento, ver qualquer um dos três primeiros volumes.

[4] Esses valores, infelizmente, são subestimativas. Explico: 15 unidades federativas (AC, DF, MA, MG, MT, PB, PE, PI, PR, RJ, RN, RO, RR, SC e TO) não divulgaram as estatísticas de ontem (25/9).

[5] Para conferir os valores numéricos, ver aqui (entre 27/12/2021 e 26/6/2022) e aqui (semanas anteriores).

* * *

26 setembro 2022

Ergo uma rosa

José Saramago

Ergo uma rosa, e tudo se ilumina
Como a lua não faz nem o sol pode:
Cobra de luz ardente e enroscada
Ou vento de cabelos que sacode.

Ergo uma rosa, e grito a quantas aves
O céu pontuam de ninhos e de cantos,
Bato no chão a ordem que decide
A união dos demos e dos santos.

Ergo uma rosa, um corpo e um destino
Contra o frio da noite que se atreve,
E da seiva da rosa e do meu sangue
Construo perenidade em vida breve.

Ergo uma rosa, e deixo, e abandono
Quanto me dói de mágoas e assombros.
Ergo uma rosa, sim, e ouço a vida
Neste cantar das aves nos meus ombros.

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1966.

23 setembro 2022

Dois amigos


Joaquín Agrasot [y Juan] (1836-1919). Dos amigos. 1866.

Fonte da foto: Wikipedia.

21 setembro 2022

Um palpite e um prognóstico: Cruzeiro vence hoje e Lula, em 2/10

F. Ponce de León

1.

Fruto de uma sucessão de erros e falcatruas, dentro e fora de campo, incluindo o envolvimento de dirigentes com o uso de helicópteros para transportar e revender pó de mármore, o Cruzeiro foi rebaixado para a série B do Brasileirão. Isso foi no final de 2019 (aqui).

A equipe não conseguiu subir nos dois anos seguintes, contrariando a expectativa da torcida. Este ano, ao que tudo indica, já livre dos traficantes de pó de mármore e contando com um bom elenco e com um treinador que sabe ler e escrever, o time tem feito uma campanha bem boa e lidera o campeonato.

Hoje à noite (21/9), em uma partida repleta de simbolismos (ao menos para mim), o Cruzeiro enfrenta um adversário histórico, o Vasco da Gama. (Trata-se do mesmo clube que, quase 50 anos atrás, surrupiou do Cruzeiro o título de campeão do Brasileirão. Sei que muitos leitores não eram nascidos em 1974, razão pela qual a lembrança possa lhes parecer absurda. Fato é que os trambiques por trás daquela final, envolvendo gente graúda já falecida – e.g., Antônio do Passo e Armando Marques –, além de outros personagens, ainda continuam vivos em minha memória.)

Se o Cruzeiro ganhar a partida de hoje, o acesso à serie A em 2023 estará assegurado. Definitivamente.

Espero que o meu time ganhe. E que seja de goleada, ao estilo do saudoso Telê Santana: jogando bem e amassando o adversário. (Abomino essas máfias com as suas casas de apostas, mas deixo aqui dois palpites: 3 a 1 ou 4 a 0.)

*


FIGURA. Vista do interior do Mineirão, em Belo Horizonte. (Fonte da foto: Galeria da Arquitetura.)

*

2.

Por falar em futebol, 11 dias nos separam das eleições gerais de 2022. As disputas este ano envolvem tanto o executivo como o legislativo. No primeiro caso, estamos a falar da presidência da República e dos governos estaduais. No segundo, estamos a falar das assembleias legislativas e do Congresso Nacional (um terço das cadeiras do Senado e todas as cadeiras da Câmara dos Deputados).

Como muitos eleitores já se deram conta, não basta apenas eleger um presidente que saiba ler e escrever, é necessário também diminuir a força dos traficantes de pó de mármore que operam nas casas legislativas, seja nas assembleias estaduais, seja no Congresso. (Boa parte dessa turma, não custa lembrar, é de camuflados e está aninhada principalmente no interior do chamado Centrão.)

3.

Em artigo publicado neste Jornal GGN (ver Como e por que a eleição presidencial deve ser resolvida em 2 de outubro), em 6/9, o autor da peça explicava como e por que o ex-presidente Lula deve ganhar a corrida presidencial já no primeiro turno.

De lá para cá, nenhuma nova pesquisa contrariou aquele prognóstico. Ao contrário: Os resultados mais recentes só estão a reforçá-lo.

Levando em conta os números da pesquisa Ipec (aqui), por exemplo, divulgados anteontem (19), eu mesmo não só reitero aquele prognóstico, como ouso dizer o seguinte (muito cá entre nós): Em 2/10, o ex-presidente Lula, o candidato que melhor representa os mais pobres e os oprimidos em geral, terá algo entre 52-55% dos votos válidos. (Talvez mais, na hipótese de que haja uma debandada de última hora entre os eleitores de outros candidatos.)

* * *

19 setembro 2022

A 15 dias das eleições, as taxas pararam de cair: Erro amostral ou sinal amarelo?

Felipe A. P. L. Costa [*].

RESUMO. – Este artigo atualiza as estatísticas mundiais a respeito da pandemia divulgadas em artigo anterior (aqui). No caso específico do Brasil, o artigo também atualiza os valores das taxas de crescimento. Entre 12 e 18/9, as taxas ficaram em 0,0242% (casos) e 0,0108% (mortes). Ambas subiram ligeiramente em relação aos valores da semana anterior, interrompendo assim trajetórias declinantes que já duravam 10 (casos) e oito (mortes) semanas. Ao contrário do que imaginam alguns, a pandemia não acabou. Máscaras e vacinas seguem na ordem do dia.

*

1. ESTATÍSTICAS MUNDIAIS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.

Levando em conta as estatísticas obtidas no fim da tarde de ontem (18/9) [1], eis um resumo da situação mundial.

(A) – Em números absolutos, os 20 países mais afetados [2] estão a concentrar 74% dos casos (de um total de 611.928.526) e 70% das mortes (de um total de 6.526.326) [3].

(B) – Nesses 20 países, 429 milhões de indivíduos receberam alta, o que corresponde a 95% dos casos. Em escala global, 597 milhões de indivíduos já receberam alta.

(C) – Olhando apenas para as estatísticas das últimas quatro semanas, eis um resumo da situação: (i) em números absolutos, a lista segue a ser liderada pelo Japão, com 3,7 milhões de novos casos; (ii) entre os cinco primeiros da lista, estão ainda a Coreia do Sul (2,15 milhões), os Estados Unidos (2,11), a Rússia (1,29) e Taiwan (910 mil). O Brasil (305 mil) está na 9ª colocação; e (iii) a lista dos países com mais mortes segue a ser liderada pelos Estados Unidos (12,72 mil); em seguida aparecem Japão (6,86 mil), Brasil (2,84), Alemanha (2,43) e Rússia (2,41).

2. ESTATÍSTICAS BRASILEIRAS: SEMANA 12-18/9.

Ontem (18/9), de acordo com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde, foram registrados em todo o país mais 4.984 casos e 42 mortes [4]. Teríamos chegado assim a um total de 34.587.047 casos e 685.376 mortes.

Na semana encerrada ontem (12-18/9), foram registrados 58.422 casos e 516 mortes. Ambos infelizmente subiram em relação aos números da semana anterior (5-11/9: 57.849 casos e 491 mortes).

3. O RITMO DA PANDEMIA EM TERRAS BRASILEIRAS.

Para monitorar de perto o ritmo e o rumo da pandemia, sigo a usar como guias as taxas de crescimento no número de casos e de mortes. Ambas subiram em relação aos valores da semana anterior, interrompendo assim trajetórias declinantes que já duravam 10 (casos) e oito (mortes) semanas.

Vejamos os resultados mais recentes.

A taxa de crescimento no número de casos subiu de 0,024% (5-11/9) para 0,0242% (12-18/9) (ver a figura que acompanha este artigo) [5].

A taxa de crescimento no número de mortes subiu de 0,0102% (5-11/9) para 0,0108% (12-18/9).

*


FIGURA. O comportamento das médias semanais das taxas de crescimento no número de casos (pontos em azul escuro) e no número de óbitos (pontos em vermelho escuro) em todo o país (valores expressos em porcentagem), entre 12/9/2021 e 18/9/2022. (Para resultados anteriores, ver aqui.) Note que alguns pares de pontos são coincidentes ou quase isso.

*

4. CODA.

Após 10 semanas de queda, a taxa de casos subiu. Após oito semanas de queda, a taxa de mortes também subiu (ver a figura que acompanha este artigo).

Em ambos os casos, estamos a falar de escaladas relativamente pequenas. A ponto de algum observador levantar o dedo e dizer que poderiam ser apenas erros de amostragem. É possível.

Em situações de crise sanitária, no entanto, a precaução é quase sempre a melhor opção. No contexto atual, portanto, um observador sensato e precavido deveria ver nas interrupções de queda um sinal amarelo.

Precaução, aliás, foi uma das coisas que faltou ontem (18) ao presidente estadunidense. Em entrevista a um renomado programa de TV, Joe Biden afirmou que “the pandemic is over” (ou “a pandemia acabou”, em tradução livre) [6].

Como escrevi em artigo anterior, a crise é mundial e ainda falta chão até o fim da pandemia. Lá como aqui, máscaras e vacinas deveriam estar na ordem do dia. (Lembrando que a vacina combate a doença, mas não impede o contágio. O que pode impedir o contágio, notadamente no interior de recintos fechados, é o uso correto de máscara facial.)

*

NOTAS.

[*] Há uma campanha de comercialização envolvendo os livros do autor – ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para mais informações ou para adquirir (por via postal) os quatro volumes (ou algum volume específico), faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos e livros, ver aqui.

[1] Como comentei em ocasiões anteriores, as estatísticas de casos e de mortes estão a seguir o painel Mapping 2019-nCov (Johns Hopkins University, EUA), enquanto as de altas estão a seguir o painel Worldometer: Coronavirus (Dadax, EUA).

[2] Os 20 primeiros países da lista podem ser arranjados em 9 grupos: (a) Entre 95 e 100 milhões de casos – Estados Unidos; (b) Entre 40 e 45 milhões – Índia; (c) Entre 30 e 35 milhões – França, Brasil e Alemanha; (d) Entre 20 e 25 milhões – Coreia do Sul, Reino Unido, Itália, Japão e Rússia; (e) Entre 15 e 20 milhões – Turquia; (f) Entre 12 e 15 milhões – Espanha; (g) Entre 10 e 12 milhões – Vietnã e Austrália; (h) Entre 8 e 10 milhões – Argentina e Países Baixos; e (i) Entre 6 e 8 milhões – Irã, México, Indonésia e Colômbia.

[3] Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, tanto em escala mundial como nacional, ver os volumes da coletânea A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado, vols. 1-5 (aqui, aqui, aqui, aqui e aqui). Sobre o cálculo das taxas de crescimento, ver qualquer um dos três primeiros volumes.

[4] Esses valores, infelizmente, são subestimativas. Explico: 15 unidades federativas (AL, AP, DF, ES, MA, MG, MT, PE, PB, PR, RJ, RN, RR, SE e TO) não divulgaram as estatísticas de domingo (18/9). Juntas, essas unidades respondem hoje por 47% dos casos e 44% das mortes registradas em todo o país. O que me leva a estimar que ao menos 4.343 casos e 33 mortes deixaram de ser informados ontem (18/9).

A situação no DF (o primeiro ou um dos primeiros a cruzar os braços aos fins de semana) continua a chamar a atenção, negativamente. Explico: O número de mortes no DF (mas não o de casos) permanece inalterado há mais de um mês. Enquanto o número de casos registrados passou de 835.156 (14/8) para 838.413.928 (18/9), o número de mortes está em 11.825 desde a semana 8-14/8. O fim das mortes por Covid-19 seria, evidentemente, uma ótima notícia. Todavia, diante do comportamento do governo do DF ao longo dos últimos dois anos e meio (e.g., o modo como tratou as medidas de proteção e combate à pandemia), não podemos deixar de levantar suspeitas diante da situação.

[5] Para conferir os valores numéricos, ver aqui (entre 27/12/2021 e 26/6/2022) e aqui (semanas anteriores).

[6] Além de precipitada, a declaração soa desrespeitosa com os próprios estadunidenses: nas últimas semanas, entre 450-500 cidadãos morreram diariamente naquele país. A entrevista foi dada a Scott Pelley, apresentador do programa 60 Minutes (ver aqui). A certa altura da conversa, o entrevistador pergunta “Sr. Presidente, é a primeira Detroit Auto Show [algo como Feira do Automóvel de Detroit] em três anos. A pandemia acabou?”. O entrevistado inicia a resposta dizendo: “A pandemia acabou [...]”. Enaltece ainda o fato de que nenhum participante do evento estaria a usar máscara. Mais adiante, repete a afirmativa de que a pandemia teria acabado. A mídia brasileira já reportou a notícia (e.g., aqui).

* * *

16 setembro 2022

O sonho de uma árvore

Poh Pin Chin

Chove.
Enfim, chove.
Enfim, a estação das águas.

Um batalhão de pingos gordos
molha e lava os meus braços nus
e arqueados.
Não sinto frio, apenas sede.

Sonho com o sopro que
me trouxe, séculos atrás. Presa
à argila onde nasci,
sigo em busca de claridade.

Amanhã de manhã, erguida
e desperta pelo lume da aurora,
passo a viver
conforme a lei da nova estação.

15 setembro 2022

Ecoturismo

David Western

O ecoturismo explodiu no mundo das viagens e da conservação como um tsunami, um verdadeiro maremoto; porém, suas origens são definitivamente mais evolutivas que revolucionárias. As raízes do ecoturismo encontram-se na natureza e no turismo ao ar livre. Os visitantes que, há um século, chegaram em massa aos parques nacionais de Yellowstone e Yosemite foram os primeiros ecoturistas. Os viajantes pioneiros que se embrenharam por Serengeti há 50 anos, e os aventureiros caminhantes do Himalaia que acamparam no Anapurna 25 anos mais tarde eram tão ecoturistas quanto os milhares que hoje fotografam os pinguins na Antártida, acompanham a migração em grupo de Belize, ou dormem nas habitações comunitárias dos nativos de Bornéu.

O século XX assistiu a uma mudança drástica e incessante nas viagens a áreas naturais. A África é um bom exemplo. O safári de caça de 1909 de Theodore Roosevelt para capturar as maiores cabeças e chifres que ele pudesse encontrar, é um exemplo clássico de sua época. Por volta da metade deste século, safáris fotográficos eram definitivamente mais populares do que as caçadas, embora também baseados nos ‘Big Five’ (os cinco grandes mamíferos mais populares entre os caçadores: o leão, a zebra, o elefante, o kudu e o rinoceronte.) Por volta dos anos setenta, o turismo de massa e individual, ainda interessado nos mamíferos grandes, estava depredando hábitats, molestando animais e destruindo a natureza. Hoje, esse comportamento está mudando. Mais visitantes estão conscientes do dano ecológico que podem provocar, do valor da vida natural e dos interesses das populações locais. Excursões especializadas – safáris de aves, competições esportivas em regiões naturais, caminhadas pela natureza e outros – são cada vez mais comuns. Esse grupo crescente, mas pequeno, constitui o que chamamos de ecoturismo. E, surpreendentemente, o ecoturismo está tornando toda a indústria de viagens mais sensível ao meio ambiente.

Fonte: Western, D. 1995. In: K. Lindberg & D. E. Hawkins, orgs. Ecoturismo: Um guia para planejamento e gestão. SP, Senac.

13 setembro 2022

La cultura del ocio

David M. Davis

Durante mucho tiempo, el hombre medio no ha dedicado más que una parte muy pequeña de su tiempo o de su reflexión a la cultura y a las ocupaciones del ocio. Estas han sido realizadas por una parte muy reducida de la humanidad, la que se encontraba en la cumbre de la escala social, a la que se llegaba gracias a proezas físicas, por arte, destreza, por habilidad o por perseverancia; se encontraba en ella un pequeño grupo compuesto de artistas, de músicos y de letrados que constituían los medios intelectuales que gravitaban en torno a la élite nacida del poder. Si hubo excepciones en este cuadro, fue, quizá, en algunas islas tropicales, donde las condiciones de vida permitían concebir este sueño paradisíaco: poco trabajo y mucho juego.

Fonte: Davis, D. M. 1968 [1967]. ¿Epoca comunitaria o era del individualismo? In: Vários, La civilización del ocio. Madri, Guadarrama.

12 setembro 2022

15 anos e onze meses no ar

F. Ponce de León

Nesta segunda-feira, 12/9, o Poesia Contra a Guerra completa 15 anos e onze meses no ar.

Desde o balanço anterior – ‘190 meses no ar’ – foram publicados aqui pela primeira vez textos dos seguintes autores: Brian T. Bunting, Dora Ann Lange Canhos, Gérard Monnier, Henrique Lins de Barros, José Eduardo Degrazia, José Santos Chocano, Murray R. Spiegel, Raymond Gras, Stéphane Hénin e Vanderlei Perez Canhos. Além de outros nomes que já haviam sido publicados antes.

Cabe ainda registrar a publicação de imagens de obras dos seguintes pintores: Emilio Sala e Plácido Francés y Pascual.

10 setembro 2022

De amor e vinho

José Eduardo Degrazia

Sinto o frutado do jardim mais próximo,
lembrando vinhos frágeis, e bebidos
ao pé da serra, prova, linhos, ninhos,
asa de pássaro fulgente, cimo.

O vento mais quente de avaras chuvas
desenha nas parreiras móveis sonhos,
minha amada bela, vária, nua,
vai beber do cálice o vinho puro.

A tarde desce lenta, luz de estrela
nova a pascer entre as ovelhas, sono,
pintura suave, tinta sobre tela.

À sombra do parreiral eu colho ervas,
que deposito amante nos teus seios,
para ir ao fim sabendo usar os meios.

Fonte: Horta, A. B. 2016. Do que é feito o poeta. Brasília, Thesaurus. Poema publicado em livro em 2011.

08 setembro 2022

Disseminação de informação: O uso da internet

Dora Ann Lange Canhos & Vanderlei Perez Canhos

A internet é um sistema de comunicação resultante de uma revolução tecnológica (a da microeletrônica), que está provocando uma verdadeira revolução cultural. Para compreender melhor a revolução internet, é fundamental conhecer o seu processo de criação e sua evolução histórica.

A internet é resultante de um programa militar norte-americano que, na década de 60, em plena guerra fria, teve por objetivo criar um sistema de comunicação menos vulnerável a um ataque nuclear. A agência responsável por esse programa foi a DARPA (Defense Advanced Research Projects Agency) que teve o mérito de buscar novas tecnologias e de garantir financiamento contínuo aos diversos projetos.

As seguintes estratégias, estabelecidas no início dos trabalhos, foram decisivas para o sucesso da internet:

+ a adoção de uma nova tecnologia baseada no conceito de comutação de pacotes;

+ o sistema evitaria o modelo centralizado;

+ os nós seriam interligados por caminhos redundantes utilizando diversos meios físicos (cabo, rádio, satélite);

+ os nós teriam autonomia para gerar, transmitir e receber mensagens;

+ o itinerário seria irrelevante.

Fonte: Canhos, D. A. L. & Canhos, V. P. 2001. In: I. Garay & B. F. S. Dias, orgs. Conservação da biodiversidade em ecossistemas tropicais. Petrópolis, Vozes.

06 setembro 2022

Como e por que a eleição presidencial deve ser resolvida em 2 de outubro


Faltam três semanas e meia para as eleições gerais de 2022. As disputas este ano envolvem tanto o executivo como o legislativo. No primeiro caso, estamos a falar da presidência da República e dos governos estaduais. No segundo, estamos a falar das assembleias legislativas e do Congresso Nacional (um terço das cadeiras do Senado e todas as cadeiras da Câmara dos Deputados). Neste artigo, vou me debruçar um pouco sobre as eleições presidenciais.

1. PESQUISAS DE OPINIÃO.

Vários institutos de pesquisa estão a operar no país e pesquisas de opinião sobre temas políticos são divulgadas com alguma regularidade. Há bastante tempo. Nem todas as pesquisas que vêm a público, claro, são dignas de nota e atenção. Não só pela temática, mas porque nem todas elas são igualmente rigorosas e confiáveis.

Pesquisas presenciais, por exemplo, são mais confiáveis do que as pesquisas remotas, feitas por telefone. Assim como amostras grandes (e.g., 20-50 mil entrevistados) tendem a gerar resultados bem mais confiáveis do que as amostras pequenas (e.g., 2-5 mil entrevistados). (No contexto deste artigo, o valor de uma pesquisa de opinião nada tem a ver com simpatias ou preferências individuais, mas sim com a adoção por parte do pesquisador de medidas que impeçam, evitem ou ao menos dificultem a produção de resultados tendenciosos ou distorcidos. Passar o dia conversando com os clientes de uma mercearia ou de um supermercado e daí inferir quais seriam as preferências eleitorais da população de uma cidade não é um exemplo de metodologia consistente e apropriada.)

2. PESQUISAS PRESIDENCIAIS.

Os resultados de uma série de pesquisas presidenciais (todas com base em entrevistas presenciais) foram integrados e divulgados ontem (5/9) em alguns veículos da mídia (e.g., aqui).

Essa série, realizada pelo Ipec, cobriu todas as 27 unidades da federação. Os resultados foram originalmente divulgados, estado por estado, no período entre 22/8 e 3/9. (É um intervalo relativamente longo durante o qual podem ter ocorrido oscilações.) Cabe observar também o tamanho da amostra. Foram ouvidos entre 800 e 1.504 eleitores, a depender do estado (ver a figura que acompanha este artigo). Somando tudo, a pesquisa ouviu um total de 25.616 eleitores.

Sei de gente que trabalha com pesquisas de opinião pública, mas eu mesmo não sou estudioso do assunto. Nem estou habituado a acompanhar de perto as pesquisas presidenciais que vêm sendo divulgadas quase que semanalmente. Feito o alerta, devo dizer que, de todas as que eu examinei até aqui, nenhuma me pareceu reunir uma amostra tão expressiva. (Basta dizer que a maioria das pesquisas nacionais que estão a ser divulgadas trabalham com amostras bem menores, algo como 2 ou 3 mil entrevistados.)

3. CANDIDATOS E DESEMPENHOS.

Cerca de duas dezenas de candidatos manifestaram interesse em participar da corrida presidencial. Desde a pré-campanha, porém, iniciada meses atrás, vários deles desistiram e saíram da disputa. Entre os que desistiram, teve gente que submergiu, teve gente que ingressou na campanha de outro candidato.

Desde o inicio da corrida, as pesquisas presidenciais têm apontado para uma distribuição bastante desigual dos votos – ou, por enquanto, das preferências. Os dois primeiros colocados, por exemplo, sempre reuniram mais de 50% das preferências. E foi assim que iniciamos o ano de 2022: Dois candidatos (doravante referidos como A e B) destacados na liderança, seguidos lá atrás por uma turma (doravante referida como Outros) de fôlego bem mais curto.

4. A SÉRIE DE PESQUISAS DO IPEC (22/8-3/9).

Chegamos assim às vésperas das eleições. Em linhas gerais (ver a figura que acompanha este artigo), eis um resumo dos resultados da série de pesquisas do Ipec:

(1) – No plano nacional, os candidatos A e B somam hoje 76,5% das preferências. As médias estaduais variam entre 69% (DF) e 89% (TO).

(2) – No plano nacional, os outros candidatos somam hoje pouco mais de 12% das preferências. As médias estaduais variam entre 6% (TO) e 18% (DF).

(3) – Por fim, eleitores indecisos e votos inválidos (brancos ou nulos) chegam a 11,4%. As médias estaduais variam entre 6% (PI) e 14% (MG e SP).

(4) – Considerando apenas os votos válidos, a corrida está a ser liderada pelo candidato A, com uma média geral de 47,74% [1]. As médias estaduais variam entre 16% (RR) e 69% (PI).

*


FIGURA. Os resultados da série de pesquisas estaduais divulgadas pelo Ipec (22/8-3/9). A primeira coluna lista os estados (em ordem alfabética das siglas), as cores identificam estados de uma mesma região geográfica. As cinco colunas seguintes indicam (i) as proporções de entrevistados que disseram preferir os candidatos A, B ou algum outro (Outros); (ii) os que disseram que pretendem anular o voto ou votar em branco (Nulo); e (iii) os que não souberam ou não quiseram responder (Indecisos). A última coluna (n) indica o número de entrevistados em cada estado. Nas colunas A e B, os números em vermelho indicam o candidato que está na frente, em cada estado. Quando não há indicação, é porque há empate técnico, de acordo com os critérios do Ipec. Nas colunas Nulos e Indecisos, a tarja cinza indica aqueles casos em que a soma de eleitores indecisos e votos inválidos é superior à de eleitores que pretendem votar em outros candidatos (Outros).

*

5. É POSSÍVEL RESOLVER NO PRIMEIRO TURNO?

Sim, é possível. Mais do que isso: A julgar apenas pelos números, sem entrar aqui nos meandros da argumentação política, é bem provável que a eleição venha a ser resolvida no primeiro turno, em 2/10.

No que segue, apresento como isso pode vir a ocorrer. Antes, porém, devo ressaltar o seguinte: nos três cenários descritos a seguir, presumo que (i) os candidatos A e B não irão perder nenhum dos votos que têm hoje; e (ii) o percentual de eleitores que pretendem anular seu voto também permanecerá inalterado.

Vejamos então os três cenários.

(1) – Cenário 1. No dia da eleição, 33% dos atuais eleitores indecisos (um em cada três) decidem votar no candidato A [2]. Este alcançaria 49,6% dos votos válidos, mas não seria eleito em primeiro turno.

(2) – Cenário 2. 20% (um em cada cinco) dos eleitores que hoje votariam em candidatos do pelotão de trás (Outros) decidem mudar o seu voto para o candidato A. Este alcançaria algo como 50,3%, e seria eleito em primeiro turno.

(3) – Cenário 3. 33% dos atuais indecisos mais 20% dos eleitores que hoje votariam em candidatos do pelotão de trás decidem votar no candidato A. Este alcançaria algo como 52,2%, e seria eleito em primeiro turno.

6. CODA.

Assim como toda experimentação científica é precedida por algum tipo de pressuposto teórico (certo ou errado, não vem ao caso), simulações e cenários são feitos para orientar a ação prática, quer estejamos a falar de incêndios florestais, epidemias ou eleições.

*

NOTAS.

[*] Há uma campanha de comercialização em curso envolvendo os livros do autor – ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para mais informações ou para adquirir (por via postal) os quatro volumes (ou algum volume específico), faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos e livros, ver aqui.

[1] Vale ressaltar que, pelas regras atuais, a eleição estará resolvida em primeiro turno se o primeiro colocado obtiver sozinho mais votos do que a soma de todos os demais candidatos.

[2] Fui conservador e, antes de efetuar esse cálculo, fiz uma conta preliminar, presumindo que, no dia da eleição, haverá entre os indecisos a mesma parcela de votos nulos que houve entre os entrevistados.

* * *

04 setembro 2022

O perfil cultural

Stéphane Hénin, Raymond Gras & Gérard Monnier

Deve-se entender por perfil cultural o conjunto constituído pela sucessão de camadas de terra, individualizadas pela intervenção dos instrumentos de cultivo, as raízes de vegetais e os fatores naturais reagindo a essas ações.

Vimos que esse conceito pode numa certa medida superpor-se ao de perfil pedológico. Por exemplo, numa rendzina acontece muitas vezes que o horizonte cultivado seja equivalente ao horizonte A; ao contrário, num solo castanho ou num solo castanho lixiviado, o perfil cultural representa um sistema de características nitidamente diferentes das do tipo pedológico.

É claro que num solo cultivado, manejado pelo homem, pode ser bem fácil distinguir os efeitos dos instrumentos de cultivo. No caso de pomares ou vinhedos, podem-se igualmente por em evidência as marcas da escavação, a localização dos buracos de plantio e, se for o caso, a zona influenciada pelas práticas aratórias interessando a camada superior do solo. Sob as pradarias, a situação pode parecer diferente. Todavia, mesmo quando a zona trabalhada não se distingue mais nitidamente do subsolo, é possível apreciar-se a estrutura da superfície modificada pelo pisoteio dos animais, o enraizamento das espécies úteis e especialmente a localização das raízes na superfície, a formação do ‘mat’, enfim o desenvolvimento da fauna hipógea, que modifica a estrutura dos horizontes superficiais e profundos; esses elementos permitem ainda, nesse caso, caracterizar o perfil.

Fonte: Hénin, S., Gras, R. & G. Monnier. 1976 [1969]. Os solos agrícolas. RJ, Forense Universitária & Edusp.

02 setembro 2022

O ofício

Casimiro de Brito

Escrevo para sentir nas veias
o voo da pedra.

Antecipação da paz
neste país de granadas
moldadas
no silêncio dos frutos.

Escrevo como quem escava
no bojo da sombra
um mar de claridade.

Pedras vivas de possibilidade,
as palavras levantam
o crime, os pássaros do pântano.

Escrevo
no grande espaço obscuro
que somos e nos inunda.

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1966.

eXTReMe Tracker