1. [...] Em A teoria da classe ociosa, Thorstein Veblen [...] descreveu o comportamento dos ricos basicamente em termos do consumo ostensivo. No entanto, sob muitos aspectos, o consumo não ostensivo é mais intrigante. Quase todos os pavões, por exemplo, têm uma plumagem extravagantemente ostensiva na cauda, a qual mantêm ereta e agitam para atrair a atenção amorosa das fêmeas. Estas não são nada indiferentes às questões do tamanho e do vigor; tais qualidades, assim como a fortuna para os ricos, são o preço do ingresso. Além disso, as fêmeas prestam rigorosa atenção a alguns detalhes inconspícuos, como o brilho e a simetria das penas. Quando um macho perde apenas cinco das cerca de 150 penas de sua cauda, as fêmeas mais exigentes tendem a evitar seu campo de dança.
Entre os ricos, do mesmo modo, os sinais inconspícuos são uma espécie de linguagem particular, de nuanças extremamente delicadas na subespécie. Uma mulher que faça parte do clube, por exemplo, pode usar o que parece ser uma blusa marrom comum. Somente seus pares serão capazes de reconhecê-lo como uma peça de seda da grife Yves St. Laurent, mais cara, digamos, do que uma capa de chuva Chanel. Similarmente, em sua casa na Itália, Sirio Maccioni, dono do elegante restaurante Le Cirque, em Nova York, dirige um despretensioso Lancia. Mas os membros do clube sabem, pelo ronronar gutural do motor, que na verdade há uma Ferrari sob a carroceria. A família Agnelli, cuja empresa fabrica os Lancias e as Ferraris, começou a produzir essa Ferrari disfarçada na década de 1980, quando a política de esquerda tornou imprudente exibir a riqueza de maneira muito explícita. [...] Fonte: Conniff, R. 2004. História natural dos ricos. RJ, Jorge Zahar.
Sobre esta pele branca um calígrafo oriental teria gravado sua escrita luminosa – sem esquecer entanto a boca: um ícone em rubro tornando mais fogo o céu de outubro
tornando mais água a minha sede sede de dilúvio –
Talvez este poeta afogado nas ondas de algum danúbio imaginário dissesse que seus olhos são duas machadinhas de jade escavando o constelário noturno (a partir do que comporia duzentas odes cromáticas)
mas eu que venero mais que o ouro-verde raríssimo o marfim em alta-alvura de teu andar em desmesura sobre uma passarela de relâmpagos súbitos sei que tua pele pálida de papel pede palavras de luz
Algum mozárabe ou andaluz decerto te dedicaria um concerto para guitarras mouriscas e cimitarras suicidas
Pego de um fósforo. Olho-o. Olho-o ainda. Risco-o Depois. E o que depois fica e depois Resta é um ou, por outra, é mais de um, são dois Túmulos dentro de um carvão promíscuo.
Dois são, porque um, certo, é do sonho assíduo Que a individual psiquê humana tece e O outro é o do sonho altruístico da espécie Que é o substractum dos sonhos do indivíduo!
E exclamo, ébrio, a esvaziar báquicos odres: – “Cinza, síntese má da podridão, “Miniatura alegórica do chão, “Onde os ventres maternos ficam podres;
“Na tua clandestina e erma alma vasta, “Onde nenhuma lâmpada se acende, “Meu raciocínio sôfrego surpreende “Todas as formas da matéria gasta!”
Raciocinar! Aziaga contingência! Ser quadrúpede! Andar de quatro pés É mais do que ser Cristo e ser Moisés Porque é ser animal sem ter consciência!
Bêbedo, os beiços na ânfora ínfima, harto, Mergulho, e na ínfima ânfora, harto, sinto O amargor específico do absinto E o cheiro animalíssimo do parto!
E afogo mentalmente os olhos fundos Na amorfia da cítula inicial, De onde, por epigênesis geral, Todos os organismos são oriundos.
Presto, irrupto, através ovóide e hialino Vidro, aparece, amorfo e lúrido, ante Minha massa encefálica minguante Todo o gênero humano intra-uterino!
É o caos da ávita víscera avarenta – Mucosa nojentíssima de pus, A nutrir diariamente os fetos nus Pelas vilosidades da placenta! –
Certo, o arquitetural e íntegro aspecto Do mundo o mesmo ainda é, que, ora, o que nele Morre, sou eu, sois vós, é todo aquele Que vem de um ventre inchado, ínfimo e infecto!
É a flor dos genealógicos abismos – Zooplasma pequeníssimo e plebeu, De onde o desprotegido homem nasceu Para a fatalidade dos tropismos. –
Depois, é o céu abscôndito do Nada, É este ato extraordinário de morrer Que há de, na última hebdômada, atender Ao pedido da célula cansada!
Um dia restará, na terra instável, De minha antropocêntrica matéria Numa côncava xícara funérea Uma colher de cinza miserável!
Abro na treva os olhos quase cegos. Que mão sinistra e desgraçada encheu Os olhos tristes que meu Pai me deu De alfinetes, de agulhas e de pregos?!
Pesam sobre o meu corpo oitenta arráteis! Dentro um dínamo déspota, sozinho, Sob a morfologia de um moinho, Move todos os meus nervos vibráteis.
Então, do meu espírito, em segredo, Se escapa, dentre as tênebras, muito alto, Na síntese acrobática de um salto, O espectro angulosíssimo do Medo!
Em cismas filosóficas me perco E, vejo, como nunca outro homem viu, Na anfigonia que me produziu Noniliões de moléculas de esterco.
Vida, mônada vil, cósmico zero, Migalha de albumina semifluida, Que fez a boca mística do druida E a língua revoltada de Lutero;
Teus gineceus prolíficos envolvem Cinza fetal!... Basta um fósforo só Para mostrar a incógnita de pó, Em que todos os seres se resolvem!
Ah! Maldito o conúbio incestuoso Dessas afinidades eletivas, De onde quimicamente tu derivas, Na aclamação simbiótica do gozo!
O enterro de minha última neurona Desfila... E eis-me outro fósforo a riscar E esse acidente químico vulgar Extraordinariamente me impressiona!
Mas minha crise artrítica não tarda. Adeus! Que eu vejo enfim, com a alma vencida, Na abjecção embriológica da vida O futuro de cinza que me aguarda! Fonte: Anjos, A. 2004. Eu e outras poesias, 46ª edição. RJ, Bertrand. A primeira edição do livro foi publicada em 1912.
4. [...] Muitos escritores têm compreendido mal, ou criticado mal, a expressão seleção natural. Alguns têm mesmo pensado que a seleção natural traz a variabilidade, visto que abrange somente a conservação das variações por acaso produzidas, quando são vantajosas ao indivíduo nas condições de vida em que se encontra. Ninguém protesta contra os agricultores, quando falam dos poderosos efeitos da seleção realizada pelo homem; ora, neste caso é indispensável que a natureza produza, a princípio, diferenças individuais que o homem escolhe para um determinado fim. Outros pretenderam que o termo seleção envolva uma escolha consciente por parte dos animais que se modificam, e inferiu-se mesmo que, não desfrutando as plantas de qualquer vontade, a seleção natural não se lhes aplica. No sentido literal da palavra, não há dúvida de que a expressão seleção natural seja expressão errada; todavia, quem tem criticado os químicos, quando [eles] se servem do termo afinidade eletiva falando dos diferentes elementos? Contudo, não se pode dizer, estritamente falando, que o ácido escolhesse a liga com a qual de preferência se combina. Diz-se que falo da seleção natural assim como de uma potência ativa ou divina; mas quem critica um autor quando este fala de atração ou gravitação regulando o movimento dos planetas? Todos sabem o que [significam], o que exprimem, estas expressões metafóricas necessárias à clareza da discussão. É difícil evitar personificar o termo natureza; por natureza entendo somente a ação combinada e os resultados complexos de um grande número de leis naturais; e, por leis, a série de acontecimentos que temos aceito. No fim de algum tempo ser-nos-ão familiares estes termos e deixaremos de lado estas críticas inúteis. [...] Fonte: Darwin, C. 1979 [1859]. A origem das espécies. SP, Hemus.
Abril florescia Na paisagem mansa. Entre os jasmineiros E as roseiras brancas Do balcão fronteiro Vi as irmãs sentadas. A menor cosia, A maior fiava... Entre os jasmineiros E as roseiras brancas, A mais pequenina, Risonha e rosada, De agulha suspensa, Sentiu que eu a olhava. A maior seguia, Silenciosa e pálida, O fuso na roca, Que o fio enroscava. Abril florescia Na paisagem mansa.
Numa tarde clara A maior chorava, Entre os jasmineiros E as roseiras brancas, Ante o branco linho Que na roca fiava. – Que tens? perguntei-lhe. Silenciosa e pálida, Indicou o vestido Que a irmã começara: Na túnica negra A agulha brilhava; Sobre o véu luzia A agulha de prata. Apontou a tarde De abril que sonhava: Naquele momento Os sinos dobravam. E na tarde clara Me ensinou suas lágrimas... Abril florescia Na paisagem mansa.
Noutro abril alegre, Noutra tarde clara, O balcão florido Solitário estava... Nem a pequenina, Risonha e rosada, Tampouco a irmã triste, Silenciosa e pálida, Nem a negra túnica, Nem a touca branca...
Apenas no fuso O linho girava Por mão invisível; E na obscura sala A lua do límpido Espelho brilhava... Entre os jasmineiros E as roseiras brancas Do balcão florido, Minha imagem dava Na lua do espelho, Que longe sonhava... Abril florescia Na paisagem mansa. Fonte: Bandeira, M. 2007. Estrela da vida inteira. RJ, Nova Fronteira. Poema originalmente publicado em 1903.
If you miss the train I’m on, you will know that I am gone You can hear the whistle blow a hundred miles A hundred miles, a hundred miles, a hundred miles, a hundred miles You can hear the whistle blow a hundred miles
Lord I’m one, Lord I’m two, Lord I’m three, Lord I’m four Lord I’m 500 miles from my home. 500 miles, 500 miles, 500 miles, 500 miles Lord I’m five hundred miles from my home
Not a shirt on my back, not a penny to my name Lord I can’t go a-home this a-way This a-away, this a-way, this a-way, this a-way Lord I can’t go a-home this a-way
If you miss the train I’m on, you will know that I am gone You can hear the whistle blow a hundred miles Fonte: álbum The best of Peter, Paul and Mary: ten years together (1970), de Peter, Paul and Mary. Canção originalmente gravada em 1961.
Na célebre tese de Thomas Malthus, o vício e a miséria impõem o limite natural básico sobre o crescimento das populações. Os estudiosos do assunto têm dado a maior atenção à miséria, isto é, à voracidade, à doença e à reserva de alimentos como forças que operam para ajustar o tamanho de uma população a seu ambiente. E o vício? Pondo de lado a carga moral deste mundo, quais os efeitos do comportamento social de uma espécie no crescimento da população e da densidade da população no comportamento social? [...] Fonte: Hardin, G., org. 1967. População, evolução & controle da natalidade. SP, Companhia Editora Nacional & Edusp. Artigo originalmente publicado em 1962.
Se acaso aqui topares, caminhante, Meu frio corpo já cadáver feito, Leva piedoso com sentido aspeito Esta nova ao esposo aflito, errante...
Diz-lhe como de ferro penetrante Me viste por fiel cravado o peito, Lacerado, insepulto, e já sujeito O tronco feio ao corvo altivolante:
Que dum monstro inumano, lhe declara, A mão cruel me trata desta sorte; Porém que alívio busque à dor amara.
Lembrando-se que teve uma consorte, Que por honra da fé que lhe jurara, À mancha conjugal prefere a morte. Fonte: Martins, W. 1978. História da inteligência brasileira, vol. 2, 2ª edição. SP, Cultrix & Edusp. Poema – com a dedicatória ‘À mameluca Maria Bárbara, mulher de um soldado, cruelmente assassinada no caminho da Fonte do Marco, perto desta cidade de Belém, porque preferiu à morte à mancha de infiel ao seu esposo’ – originalmente publicado em 1850.
Guardo um segredo n’alma e um mistério na vida, Imorredouro amor que irrompeu de momento. Se o mal é sem remédio, a queixa é descabida E a que me fez o mal, nunca ouviu meu lamento.
Por ela já passei – sombra despercebida, E ao meu lado a sentir, no meu isolamento! Ao termo chegarei dessa terrena lida, E não ouso pedir, e receber não tento.
Quanto a ela, apesar da doçura e carinho Com que Deus a dotou, seguirá seu caminho, Sem ouvir que a acompanha um murmúrio de amor...
E, fiel ao seu dever que austeramente zela, Ela dirá, lendo os meus versos plenos dela: – “O soneto de Arvers tem mais um tradutor!” Fonte: Martins, W. 1979. História da inteligência brasileira, vol. 7. SP, Cultrix & Edusp. Versão publicada em 1921; o poema original de Félix Arvers foi publicado em 1833.
Ruínas de um templo: pórticos fendidos, Muros por terra, pedras amontoadas Sobre outras pedras, mármores partidos, Altares nus, colunas derrocadas.
Sobre os velhos escombros denegridos, – Polvos – as heras, verdes e esgalhadas, Entrelaçam tentáculos torcidos, Braços recurvos, caudas enroscadas.
Minh’alma é um templo em ruínas: desabaram, Foram por terra as ilusões e os sonhos... E, hoje, sobre os destroços que ficaram,
Na agonia dos males sem remédio, A enlaçá-los, contorcem-se os medonhos, Formidáveis tentáculos do tédio. Fonte: Martins, W. 1978. História da inteligência brasileira, vol. 5. SP, Cultrix & Edusp. Poema originalmente publicado em 1911.
No meio do expediente de ontem, quarta-feira, o Poesia contra a guerra superou a marca das 50 mil visitas. Do balanço numérico anterior – ver “Quarenta mil visitas”, em 23/6 – até ontem (15/10) ocorreram em média cerca de 87 visitas/dia. O recorde positivo de visitantes únicos em um só dia permanece em 185, alcançado em 4/6.
Ó tísicos Romeus! ó corações doentes. Que ficais, ao luar, cismando horas inteiras; Ó magros menestréis, tristes como os poentes E estéreis como o seio anêmico das freiras!...
Profetas ideais, fantásticos videntes, Que andais pelos bordéis, dormindo nas cadeiras... Por que tanto chorais? – sofreis de dor de dentes? Deixaram-vos sem roupa as vossas lavadeiras?
Aves do madrigal, canários sem gaiola, Que andais, como um mendigo, a suplicar a esmola De um bravo à insipidez dalgum recitativo...
Atirai para um canto as vossas elegias; Deixai de plagiar o morto Jeremias; Imitai Baudelaire, que mesmo morto é vivo. Fonte: Martins, W. 1978. História da inteligência brasileira, vol. 4. SP, Cultrix & Edusp. Poema originalmente publicado em livro em 1880.
Neste domingo, 12/10, o Poesia contra a guerra completa dois anos no ar. Ao fim do expediente de ontem, o contador instalado no blogue indicava que 49.618 visitas haviam sido registradas.
Nos últimos 12 meses, foram ao ar 328 postagens (incluindo esta), trazendo textos de 196 novos autores, além de outros que já haviam sido publicados no primeiro ano – ver Aniversário de um ano. Eis a lista completa desses 196 autores:
Adelaide Crapsey, Adolfo Casais Monteiro, Adriano Espíndola, Affonso Ávila, Al Berto, Albert Einstein, Alberto de Lacerda, Alda Lara, Álvaro de Campos, Ana Hatherly, Ana Maria Machado, Ana Paula Tavares, Ângelo Lima, António Barahona da Fonseca, Antônio Girão Barroso, António Maria Lisboa, António Nobre, António Ramos Rosa, Archibald MacLeish, Armando Freitas Filho, Artur Azevedo, Arturo Carrera, Arturo Torres Rioseco, Auguste de Saint-Hilaire, Augusto Frederico Schmidt e Augusto Meyer;
Bandeira Tribuzi, Barry Commoner, Basílio da Gama, Bento Teixeira e Bocage;
Carlos Nejar, Carole King, Cassiano Ricardo, Charles B. Heiser Jr., Christina Rossetti e Cruz e Souza;
D. H. Lawrence, Da Costa e Silva, Daniel Defoe, Daniel J. Kevles, Dantas Motta, Dante Milano, David Ehrenfeld, David Mourão-Ferreira, Desmond Morris, Dolores Duran, Dom Dinis, Domitila Barrios de Chungara, Dora Ferreira da Silva e Douglas J. Futuyma;
E. E. Cummings, Edmund Wilson, Eduardo Alves da Costa, Egito Gonçalves, Elliot Aronson, Elizabeth Barrett Browning, Emílio de Meneses, Emílio Moura, Eörs Szathmáry e Eugénio de Andrade;
Fausto Wolff, Felipe D’Oliveira, Fiama Hesse Pais Brandão, Flávio Aguiar, Fontoura Xavier, Francesco Cavalli-Sforza, Francisco Alvim, Francisco Otaviano, Franz Kafka e Friedrich Hölderlin;
Gabriel García Márquez, Gabriela Mistral, Gastão Cruz, Gerardo Mello Mourão, Gerome Ragni, Gilka Machado, Glauco Mattoso e Guimarães Passos;
Hans Eysenck, Heitor Ferraz Mello, Helder Macedo, Helena Cronin, Herberto Helder, Hermes Fontes, Hipócrates e Horst Rieck;
Iacyr Anderson Freitas, Ivan Junqueira e Ivani Kotait;
J. R. R. Tolkien, Jack Cohen, Jack London, Jacob Grimm, Jacyntho Lins Brandão, James Rado, Jane Goodall, Jean Piaget, Jean Ziegler, Joan, Joan Roughgarden, Joaquim Cardozo, John E. Young, John Maynard Smith, John R. Searle, Jorge Carrera Andrade, José Asunción Silva, José Blanc de Portugal, José Carlos Capinan, José Craveirinha, José Tolentino Mendonça, Juan Malpartida, Juan Ramón Jiménez e Junqueira Freire;
Kai Hermann, Karl Popper e Konrad Lorenz;
L. Frank Baum, Langston Hughes, Laurindo Rabelo, Lêdo Ivo, Leon Tolstói, Leon Trotsky, Leonard Barden, Lou Reed, Luca Cavalli-Sforza, Luciano Cânfora, Luís Forjaz Trigueiros, Luiz Tatit, Luiza Neto Jorge e Lygia Bojunga;
Manoel de Barros, Manuel Gutiérrez Nájera, Manuel Ulacia, Marcia Lee Anderson, Marciano Vasques, Maria Alberta Menéres, Maria Ângela Alvim, Maria Anna Acciaioli Tamagnini, Maria Teresa Horta, Marian S. Dawkins, Mariano Brull, Mario Bunge, Mário de Andrade, Mário Faustino, Marly de Oliveira, Martin Codax, Mauro Mota, Michael Eysenck e Michael Goulding;
Natália Correia, Natalie Angier, Natalie Rogers, Neil Young, Nicanor Miranda e Nuno Júdice;
Pablo Antonio Cuadra, Pedro Tamen e Peter Sinfield;
Raul de Carvalho, Raúl Zurita, Ribeiro Couto, Richard Feynman, Roald Dahl, Robert Creeley, Robert Jay Lifton, Robert E. Ricklefs, Robert Goodland, Roberto Domeneck, Roberto Echavarren, Roberto Piva, Rodrigo Garcia Lopes, Roger Lewin, Rogério Andrade Barbosa, Rosana Rios, Rui Knopfli e Ruy Belo;
Sá de Miranda, Salette Tavares, Sebastião da Gama, Sérgio de Castro Pinto, Sherwin B. Nuland, Simon Schama, Sólon Borges dos Reis e Stephen Jay Gould;
Taís Guimarães, Tony Banks e Torquato Neto;
Vera Pedrosa, Vicente de Carvalho e Victor Manuel Mendiola;
Wilhelm Grimm, William Blake, William Golding, William H. Calvin e Woody Guthrie.
Cabe ainda registrar que, no mesmo período, foram publicadas imagens de obras de 58 pintores, a saber: Adriaen van Utrecht, Albert Bierstadt, Alfred Sisley, Angélico, Annibale Carracci, Arkady Rylov e Artemisia Gentileschi; Berthe Morisot; Camille Pissarro, Canaletto, Candido Portinari e Charles Gleyre; Dominique Ingres; Édouard Vuillard; Ferdinand Hodler, Francis Picabia, Frans Hals e Frédéric Bazille; Georg Heinrich Croll, Georges de La Tour, Georgia O’Keeffe, Giotto, Guercino e Gustave Courbet; Henri de Toulouse-Lautrec; Isaac Levitan; Jacob Lawrence, James McNeill Whistler, Jan Steen, Jasper Johns, Jean-Baptiste-Siméon Chardin, Jean-Michel Basquiat, John Constable, John James Audubon, John Singer Sargent, José Ferraz de Almeida Junior, Josefa de Óbidos, Joseph Wright of Derby e Judith Leyster; M. C. Escher, Martin Johnson Heade, Mary Cassatt, Masaccio, Max Ernst, Mikhail Vrubel e Mstislav Dobuzhinsky; Nicolas Poussin, Norman Rockwell e Nuno Gonçalves; Quentin Massys; Roelant Savery e Rogier van der Weyden; Thomas Gainsborough; Vasily Surikov; William Holman Hunt, William Orpen, William Turner e Winslow Homer.
Quando eu morrer, não chorem minha morte, Entreguem o meu corpo à sepultura; Pobre, sem pompas, sejam-lhe a mortalha Os andrajos que deu-me a desventura.
Não mintam ao sepulcro apresentando Um rico funeral d’aspecto nobre: Como agora a zombar me dizem vivo, Digam-me também morto – aí vai um pobre!
De amigos hipócritas não quero Públicas provas de afeição fingida; Deixem-me morto só, como deixaram-me Lutar contra a má sorte toda a vida.
Outros prantos não quero, que não sejam Esse pranto de fel amargurado De minha companheira de infortúnios, Que me adora apesar de desgraçado.
O pranto, açucena de minh’alma, Do coração sincero, d’alma sã, De um anjo que também sente meus males, De uma virgem que adoro como irmã.
Tenho um jovem amigo, também quero Que junte em minha Essa os prantos seus Aos de um pobre ancião que perfilhou-me Quando a filha entregou-me aos pés de Deus
Dos meus todos eu sei que terei preces, Saudades, lágrimas também; Que não tenho a lembrança de ofendê-los E sei quanta amizade eles me têm.
E tranqüilo, meu Deus, a vós me entrego, Pecador de mil culpas carregado: Mas os prantos dos meus perdão vos pedem, E o muito que também tenho chorado. Fonte (estrofes 1, 3, 4 e 8): Martins, W. 1978. História da inteligência brasileira, vol. 2, 2ª edição. SP, Cultrix & Edusp. Poema originalmente publicado em 1867.
Passou. A vida é assim: é o temporal que chega, Ruge, esbraveja e passa, ecoando, serra a serra, No furioso raivar de indômita refrega Que as montanhas abala e os troncos desenterra.
Mas o pranto, afinal, que essa cólera encerra Tomba: é a chuva que cai e que a planície rega; E a cada gota, ali, cada germe se apega Fecundando, a minar, toda a alagada terra.
Também o coração do convulsivo aperto Da dor e das paixões, das angústias supremas, Sente-se livre, após, a um grande choro aberto.
Alma! já que não é mister que ansiosa gemas, Alma! fecunda enfim nas lágrimas que verto, Possas tu germinar e florescer em Poemas!... Fonte: Martins, W. 1978. História da inteligência brasileira, vol. 5. SP, Cultrix & Edusp. Poema originalmente publicado em 1901.
Pela a parte do Sul, onde a pequena Ursa se vê de guardas rodeada, Onde o Céu luminoso mais serena Tem sua influição, e temperada; Junto da Nova Lusitânia ordena A natureza, mãe bem atentada, Um porto tão quieto e tão seguro, Que pela as curvas Naus serve de muro.
É este porto tal, por estar posta Uma cinta de pedra, inculta e viva, Ao longo da soberba e larga costa, Onde quebra Netuno a fúria esquiva. Entre a praia e pedra descomposta, O estanhado elemento se deriva, Com tanta mansidão, que uma fateixa Basta ter à fatal Argos aneixa.
Em o meio desta obra alpestre, e dura, Uma boca rompeu o Mar inchado, Que, na língua dos bárbaros escura, Pernambuco de todos é chamado. De Para’na que é Mar; Puca, rotura, Feita com fúria desse Mar salgado, Que sem no derivar cometer míngua, Cova do Mar se chama em nossa língua.
Para entrada da barra, à parte esquerda, Está uma lajem grande e espaçosa, Que de Piratas fora total perda, Se uma torre tivera suntuosa. Mas quem por seus serviços bons não herda Desgosta de fazer cousa lustrosa, Que a condição do Rei que não é franco O vassalo faz ser nas obras manco. Fonte (estrofes 1, 2 e parte da 4): Fonte: Martins, W. 1978.História da inteligência brasileira, vol. 1, 3ª edição. SP, Cultrix & Edusp. O trecho acima corresponde às estrofes 17-20 de um poema, ‘Prosopopéia’, originalmente publicado em 1601.
Nessa tristeza mórbida, secreta, Que te afugenta as sombras do repouso, Eu vejo a hipocondria, a febre infecta – Florescências do pântano do gozo.
Por uma noite de luar repleta, Eu, contudo, quisera, fervoroso, Sentir pulsar esta paixão discreta No bronze do teu seio tormentoso.
Depois... morrer! beijando como o pária Na liça da peleja sanguinária A montanha de lodo em que se cose!
És o perfume negro, a flor do pasmo, Que no silêncio morno do marasmo Faz-me sonhar os estos da nevrose!... Fonte: Martins, W. 1978. História da inteligência brasileira, vol. 4. SP, Cultrix & Edusp. Poema originalmente publicado em 1876.
Morrer... dormir... não mais! Termina a vida, E com ela terminam nossas dores; Um punhado de terra, algumas flores, E, às vezes, uma lágrima fingida!
Sim! minha morte não será sentida; Não deixo amigos, e nem tive amores! Ou, se os tive, mostraram-se traidores, – Algozes vis de uma alma consumida.
Tudo é podre no mundo! Que me importa Que ele amanhã se esboroe e que desabe, Se a natureza para mim é morta!
É tempo já que o meu exílio acabe... Vem, pois, ó Morte, ao Nada me transporta! Morrer... dormir... talvez sonhar... quem sabe? Fonte: Martins, W. 1978. História da inteligência brasileira, vol. 2, 2ª edição. SP, Cultrix & Edusp. Poema originalmente publicado em 1881.
– Corpo que se encontrou abandonado de alma, corpo que se não pôde à ação do ar decompor – uma pedra é uma vaga imóvel... É uma calma recordação do mar de que foi leito a estrada, uma vaga do mar dos Tempos, retardada, que por aí ficou sem sentidos, parada, adormecida por um íntimo torpor.
É a Impossibilidade esculturada. Dorme. Secou-lhe o sangue, e não consegue apodrecer. Vive? É possível. Morre? É provável. Conforme a Vida e a Morte... A pedra é um ponto de partida. É o princípio da Morte, é o princípio da Vida... É um gesto contrariado, é uma força contida, É o Ser que adormeceu em caminho do Ser... Fonte: Martins, W. 1978. História da inteligência brasileira, vol. 5. SP, Cultrix & Edusp. Poema originalmente publicado em 1913.
No próximo domingo, dia 12/10, o Poesia contra a guerra completará dois anos de atividade. Ao longo da semana, como um modo de comemorar a data e – espero – contemplar os visitantes do blogue, pretendo publicar aqui poemas e textos encontrados nos volumes da coleção História da inteligência brasileira (7 vols., 1977-1978, Cultrix & Edusp), de Wilson Martins, uma obra que faz jus à expressão “marco da literatura”.
1. Quinta-feira, doze de julho. Isso ficou registrado na minha cabeça de um jeito tão forte que nunca esqueci. Recebi a caixa de papelão, com as quatro bordas da tampa entrelaçadas. Pesava muito. De fora, já dava para perceber que estava repleta de papéis. Logo dentro um bilhete, preso na corda de um dos pacotes: Prof. J... Talvez isso lhe interesse. A....
Passei a noite lendo a esmo a papelada. Na pilha amarrada, em que estava preso o bilhete de A..., havia um romance. Fiquei surpreso e fascinado, tanto que varei a madrugada e perdi a hora, ao amanhecer, de ir para a escola. Tive de inventar uma desculpa, que não estava me sentindo bem. Alguma verdade nisso. Eu nem dormido tinha. [...] Brandão, J. L. 1997. O fosso de Babel. RJ, Nova Fronteira.
Nas tuas horas de arrependimento, Pensando em mim, o próprio amor maldizes, E, revolvendo o peito nas raízes, Falas, até, nas grades de um convento.
Do gozo tiras o maior tormento, Das dores tiras as mais negras crises. Nos dias em que somos mais felizes, Eu leio tudo no teu pensamento.
Tu vês o inferno quando eu vejo a aurora, E nos teus olhos, onde a dor se imprime, Deus me acena, formosa pecadora.
Bradas ao céu de medo, e aos céus eu brado: Tu – pedindo perdão para o teu crime, Eu – pedindo que aumente o teu pecado. Fonte: Martins, W. 1978. História da inteligência brasileira, vol. 5. SP, Cultrix & Edusp. Poema originalmente publicado em 1901.
Julgavas, então, que a poesia era um discurso de palavras em sentido? Sei quanto a musa aprecia glória, poder e uniforme, quanto aguarda o cavaleiro que produz. A vida, afinal, anda lá fora, antes da folha ter passado a prensa; a mais pequena árvore é verde eterna, comparada ao arbusto que, mal tocada a haste, se desvai em fumo.
Por isso eu fico lendo as crónicas, as lendas, o jornal, que bem ou mal, cruza as palavras com o tempo, e contudo! quando o lábio se engana, solta a mais aguda fífia do trombone, e de repente o corpo sabe a gente, e então se diz: eis a verdadeira e pura poesia! pois seria, talvez, somente a tua mão, cobrindo a folha. Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores.